Desafios da Indústria Química e Segmento de Cloro-Álcalis no Brasil

Segundo dados de 2023[1], o setor químico brasileiro tem faturamento em torno de US$ 164 bilhões, respondendo por cerca de 11% do PIB industrial brasileiro e gerando cerca de dois milhões de empregos diretos e indiretos. Apesar do seu tamanho ainda robusto, fruto da tradição da Química brasileira, simbolizada pelo estabelecimento da Sociedade Brasileira de Química em 1922 e da fundação da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química) em 1964, o setor infelizmente tem apresentado uma retração contínua nas últimas duas décadas que podem ser observadas no gráfico abaixo:

De um lado, a contínua redução da utilização da capacidade instalada – ressaltando que houve uma pequena melhora em 2024, reflexo dos programas de incentivos à indústria (REIQ) – e por outro lado na crescente quantidade de importados, cujo número dobrou de 2015 a 2024, que vem causando desconforto e preocupação no setor produtivo brasileiro[2]. A desindustrialização é um fato, com todas as suas consequências para a economia e para a sociedade como um todo, como por exemplo na geração de empregos que exigem um maior grau de especialização, e que, portanto, são mais bem remunerados.
Já as origens do setor de cloro-álcali no Brasil remontam a 1936, no início da operação da Companhia Eletroquímica Fluminense, no Rio de Janeiro, seguido pela inauguração, no ano seguinte, da Companhia Nitro Química Brasilieira, em São Paulo[3]. De uma forma muito resumida, trata-se de um processo em que um sal – cloreto de sódio principalmente, mas também de potássio – é submetido a uma corrente elétrica em uma célula eletroquímica produzindo um hidróxido (soda ou potassa cáustica), cloro e hidrogênio, sendo relevante os dois primeiros. Aqui é importante frisar que a indústria precisa encontrar saídas comerciais para ambos os produtos, de forma a ter uma porcentagem razoável de utilização da planta a fim de manter a sustentabilidade do negócio. Se há por exemplo uma queda na demanda de cloro, por algum motivo, haverá uma redução na produção de soda cáustica e vice-versa; e é um fato que os dois mercados – soda cáustica e cloro – possuem dinâmicas próprias e independentes. Este processo é eletrointensivo, e isto torna o custo da energia como um fator de vantagem competitiva, que explica a grande competitividade dos produtores americanos depois da revolução do gás de xisto (shale gas) a partir de 2010.
A importância da indústria de cloro-álcalis é expressa pelo número de aplicações em distintos mercados, o que justifica a sua classificação como uma indústria básica. Os principais usos da soda cáustica em larga escala são a indústria de alumínio (através do processo Bayer) e na indústria de celulose (deslignificação da polpa de celulose), no que faz o Brasil um grande consumidor. Do outro lado da cadeia, o cloro, as principais aplicações são a síntese do monômero de PVC (policloreto de vinila, um plástico de engenharia de ampla utilização) e o tratamento de água, na aplicação de cloro, diretamente ou através dos seus derivados, como por exemplo o hipoclorito de sódio. Para a potassa cáustica, o seu uso é mais diversificado em diferentes processos na indústria, embora no caso do Brasil uma aplicação importante é na fabricação de glifosatos, uma classe de herbicida largamente utilizado no Brasil.
Do ponto de vista mercadológico, há um importante aspecto deste segmento: enquanto a soda cáustica é uma commodity global, o cloro, por suas restrições de transporte e segurança, é um produto que é consumido próximo ao local que é produzido. A soda é transportada em solução aquosa de 50% através de navios tanque, sendo alguns projetados especialmente para este fim, os assim denominados navios CABU (Caustic Bulk Vessels) em que quantidades de até 27.000 toneladas são transportadas, na maioria das vezes tendo com destino grandes fabricantes de alumina no Brasil e Austrália. Há um fluxo global desta commodity, e é importante notar que o transporte é um fator econômico extremamente relevante, chegando a atingir 40% do custo total da operação, notadamente nos ciclos de baixa de preços.
[1] Relatório REIQ 2023, baseado em dados da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química), disponível em https://www.gov.br/mdic/pt-br/assuntos/competitividade-industrial/reiq/relatorios-anuais/reiq-relatorio-2023.pdf/@@download/file/REIQ%20-%20Relat%C3%B3rio%202023.pdf
[2] CORDEIRO, André Passos. Frear o surto de químicos importados no Brasil é urgente. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 15 de Julho de 2024, Economia.
[3] Cloro-Álcalis: Origem, Evolução da Indústria e Valor para a Sociedade. Abiclor, 2018.